ENSINO BILÍNGUE E AS DESIGUALDADES DE GÉNERO EM MOÇAMBIQUE
um olhar para os dados estatísticos do Ministério de Educação de 2023
Resumo
Este artigo, de pesquisa bibliográfica e análise documental, analisa o papel do ensino bilíngue na retenção da rapariga na escola e na redução das desigualdades de género, a partir da comparação do número de raparigas que iniciam a 1ª classe e as que chegam à 6ª classe. Com efeito, fez-se uma revisão de literatura das obras que abordam a temática da educação bilíngue (CHIMBUTANE, STROUND 2011), a alfabetização inicial em língua Materna (CHIMBUTANE, 2011), política linguística e direito linguístico (UNESCO, 1996 2000a e 2002). Igualmente, fez-se a colecta de dados em diversos documentos tais como o levantamento estatístico de 2023 do MINEDH, (INDE 1997; INE 2019, 2023) e Programas do 1º ao 3º Ciclo do Ensino Básico de Moçambique (2003, 2015). O nosso interesse surge pelo facto de estudos mostrarem que a inclusão das línguas moçambicanas como meio de ensino não só resolvia o problema das altas taxas de desperdício escolar (desistências e repetências) entre 1984 a 2000 que se acreditavam estar relacionadas com a língua usada como meio de ensino, mas também para a retenção da rapariga na escola. Pois, o papel da mulher está associado ao lar e à família o que faz com que ela esteja pouco exposta às línguas de comunicação usadas fora desse contexto, incluindo a escola. E como consequência, a escola deixa de ser um espaço acolhedor e passa a ser o lugar onde se multiplicam as desigualdades de género. Embora consideremos que mais estudos são necessários para explicar as razões de desperdício escolar, os dados de 2023 analisados mostram que o ensino bilíngue oferece soluções para este problema, pois, os números do ensino monolingue levam-nos a defender que a língua de ensino pode estar a ser um dos obstáculos enfrentados pelas alunas. Com efeito, vimos que nas duas modalidades de ensino, há mais desperdício de raparigas no monolíngue, com 214.029 a mais em comparação com o bilíngue.
Referências
BENSON, C. Bilingual Education in Africa: An exploration of encouraging connections between language and girls’ schooling. in Melin, M. (ed). Education - A Way out of Poverty? Research presentations at the Poverty Conference 2001. 12. Stockholm: Sida, 2002.
BENSON, C. Girls, educational equity and mother tongue. Bangkok: UNESCO Bangkok, p. 1-14, 2005.
CALVET, L. J. As políticas linguísticas. São Paulo: Parábola Editorial – Ipol, 2007.
CARVALHO, J. E. Metodologia do trabalho científico: saber fazer investigação para dissertações. 2ª ed. Lisboa: Editora Escolar, 2009.
CORSON, D. Language, Minority Education and Gender: Linking Social Justice and Power. Clevedon: Multilingual Matters, 1993.
CHIMBUTANE, F. O uso da língua materna como recurso no processo de ensino e aprendizagem de/em segunda língua. In: Chimbutane, F.; Stround, C. (Orgs). Educação bilingue em Moçambique: reflectindo criticamente sobre políticas e práticas. Maputo: Textos Editores, p. 75-104, 2011.
CHIMBUTANE, F.; STROUND C. (Orgs). Educação bilingue em Moçambique: reflectindo criticamente sobre políticas e práticas. Maputo: Textos Editores, 2011.
GUNDANE, L. Política linguística: educação inclusiva em contextos de diversidade linguística e cultural em Moçambique. In: Revista científica da UEM: Série. Ciências Sociais, v. 1, n.º 2, p. 112-125, 2019.
GUNDANE, L. (no prelo). Políticas Linguístico-Educacionais: Crenças, Ideologias e Atitudes Linguísticas da Comunidade Local Face ao Ensino do Echuwabo no Distrito de Namacurra – Província da Zambézia. Relatório do Estudo de Campo.
INSTITUTO NACIONAL DE DESENVOLVIMENTO DA EDUCAÇÃO. Relatório do Debate sobre «Estratégias de Introdução e Expansão de Ensino em Línguas Moçambicanas». Maputo: INDE, 1997.
INSTITUTO NACIONAL DE ESTATÍSTICA. Características Sociodemográficas das Crianças em Moçambique. Instituto Nacional de Estatística – Moçambique, 2023.
INSTITUTO NACIONAL DE ESTATÍSTICA. IV Recenseamento Geral da População e Habitação, 2017: Resultados Definitivos – Moçambique, Maputo: INE, 2019.
LANGA DA CÂMARA, C. (no prelo). Gender representation in Cinyungwe bilingual education books.
LEMOS, A. F. F. C. Língua e cultura em contexto multilingue: um olhar sobre o sistema educativo em Moçambique. In: Educar em Revista, Curitiba, v. 34, n. 69, p. 17-32.80, 2018.
LÜDKE, M.; ANDRÉ, M. E. Pesquisa em educação: abordagens qualitativas. São Paulo: EPU, 1988.
MICHEL, M. H. Metodologia e pesquisa científica em ciências sociais: um guia prático para acompanhamento da disciplina e elaboração de trabalhos monográficos. São Paulo: Atlas, 2005
MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO. Programa de educação bilíngue para o IIº ciclo do ensino básico. Maputo: INDE, 2003.
NUSSBAUM, M. “Women’s Education: A global challenge,” in Journal of Women in Culture and Society. 29:2, pp. 325-355, 2003.
O’GARA, C. e KENDALL, N. Beyond enrollment: A handbook for improving girls’ experiences in primary classrooms. Research conducted for the Advancing Basic Education and Literacy (ABEL2) consortium. Washington DC: Creative Associates International, 1996.
PESSOA, M. Pesquisa Científica. São Paulo: Editora Cortez, 2012
REPÚBLICA DE MOÇAMBIQUE. Constituição da República. Maputo: Imprensa Nacional de Moçambique, 2004.
SAVIN-BADEN, M.; MAJOR, C. H. (ed). New approaches to qualitative research. New York: Routledge, University of Nottingham, 2010
SILVA, G. Educação e género em Moçambique. Centro de Estudos Africanos da
Universidade de Porto, 2007. Disponível em http://www.africanos.eu .
UNESCO. Investir na diversidade cultural e no diálogo intercultural: relatório mundial da UNESCO, resumo. Programme and meeting document. CLT.2009/WS/9, 2009. Disponível emhttps://unesdoc.unesco.org/ark:/48223/pf0000184755_por
UNESCO Office in Brasilia [844], Brazil. Educação como exercício de diversidade. Ministry of Education, Associação Nacional de Pós-Graduação e Pesquisa em Educação (Brazil), coleção Educação Para Todos, 2005. Disponível em https://unesdoc.unesco.org/ark:/48223/pf0000143241
UNESCO. Declaração universal sobre a diversidade cultural. Clt. 2002/WS/9, 2002. Disponível em https://www.oas.org/dil/port/2001%20Declara%C3%A7%C3%A3o%20Universal%20sobre%20a%20Diversidade%20Cultural%20da%20UNESCO.pdf
UNESCO. The Dakar Framework for Action. Education for All: Meeting Our Collective Commitments. Dakar: World Education Forum, 2000a. Disponível em http://unesdoc.unesco.org/images/0012/001211/121147e.pdf
UNESCO. Declaração Universal dos Direitos Linguísticos. Barcelona, 1996. MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO. Estatística da Educação. Levantamento Escolar – 2023. Maputo 2023.